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Diversidade epistémica e justiça cognitiva em debate na ECA

A académica brasileira Prof.ª Doutora Maria Aparecida Moura, professora titular da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), defendeu, esta Quinta-feira, na Escola de Comunicação e Artes (ECA), a necessidade urgente de reformular práticas institucionais ocidentais, de modo a promover de forma mais justa e crítica a diversidade epistémica nos países africanos.

A intervenção teve lugar durante a palestra subordinada ao tema “Autoridade epistêmica em tempos de inteligência artificial generativa: implicações para a organização e circulação do conhecimento científico”.

Na sua análise, Maria Aparecida argumenta que as instituições culturais como Museus, Bibliotecas e Arquivos operam historicamente sob lógicas estruturais de propriedade intelectual e autoridade que desconsideram saberes comunitários e cosmologias não ocidentais.

“Trata-se de um processo que tende a descontextualizar esses materiais e seus significados originais, e a romper as relações que as comunidades mantêm com os seus bens culturais”, afirmou.

Segundo a académica, estas práticas derivam da lógica colonial que atribui ao ocidente o direito de colectar, estudar e dispor do património cultural de outros povos, reforçando dinâmicas hierárquicas de poder e apagando epistemologias alternativas.

Mais do que uma crítica histórica, Maria Aparecida chama atenção para o papel estratégico e ético dos profissionais da informação, que operam classificações, vocabulários, meta-dados e sistemas de acesso que estruturam e, muitas vezes, limitam o modo como o conhecimento é produzido e circulado.

“É necessário desconfiar das promessas de neutralidade técnica e afirmar com rigor e sensibilidade que toda mediação é, também, uma escolha política”, destacou, referindo-se ao crescente uso de tecnologias algorítmicas na gestão do saber.

Para a académica, a actual “abertura informacional”, muitas vezes celebrada como democratização do conhecimento, pode esconder novas formas de dominação algorítmica, em que a autoria se desvincula do corpo, do contexto social e da trajectória histórica, sendo reabsorvida por infra-estruturas tecnológicas que reforçam desigualdades epistemológicas.

O que parece ser uma abertura pode ser, na verdade, uma nova forma de controlo e exclusão, advertiu. Apesar da crítica firme, Maria Aparecida deixa claro que não se opõe ao diálogo com outras formas de produção de conhecimento. Pelo contrário, defende um reposicionamento crítico, que permita remodelar os sistemas de organização do saber a partir da realidade local.

“Não estou a propôr criar dificuldades do diálogo informacional com outras instituições de produção de conhecimento, mas que tenhamos uma reflexão crítica”, rematou.

Na ocasião, a Directora da ECA, Prof.ª Doutora Ezra Nhampoca, recordou o percurso histórico da criação do curso de Ciências da Informação em Moçambique, sublinhando o contributo dos pioneiros que conduziram os estudos de viabilidade para a sua implementação, e enalteceu o papel da reflexão académica na consolidação do campo.