
“Tenho o desafio de transformar o CAIRIM num centro de excelência de nίvel-2
da UNESCO, até 2024”
Prof. Doutora. Solange Macamo, Directora do CAIRIM
Prof. Doutora Solange Laura Macamo é docente de Arqueologia e Gestão do Património, no
Departamento de Arqueologia e Antropologia, na Faculdade de Letras e Ciências Sociais da UEM (FLCS). Actualmente, acumula as tarefas de docência e investigação com a de Directora do Centro de
Arqueologia e Recursos da UEM (CAIRIM) localizado na Ilha de Moçambique, onde tem o desafio de transformá-lo num Centro de Excelência de nível-2 da UNESCO, até 2024. Abraçou a carreira, há 30 anos, como arqueóloga e confessa que, na altura, era uma actividade exercida por poucas mulheres.
Entretanto, o advento das tecnologias facilitou o exercício da profissão e, hoje, a arqueologia já atrai
muitas mulheres. Na sua caminhada, Solange Macamo, entre outros, já foi Directora Nacional do
Património Cultural, no Ministério da Cultura e Turismo, entre 2010 e 2016. A sua maior paixão é
ensinar e formar a futura geração de arqueólogos no país.
Quando é que a Doutora decidiu abraçar a arqueologia e como era vista nessa altura uma mulher
numa actvidade considerada de homens?
Quando comecei, eram muito poucas as mulheres. Lembro-se da Professora Teresa Cruz e Silva, de
quem eu me inspirava muito, mas depois ela abandonou a arqueologia. Recordo-me também da
Professora Ana Loforte que começou por ser arqueóloga e depois enveredou pela antropologia. Em
parte, porque estávamos no período de guerra, não havia trabalho de campo, sem o qual não existe
arqueologia e não conheço um arqueólogo de escritório. Estas duas mulheres abraçaram outras
carreiras mas eu fiquei até hoje.
Quando é que, efectivamente, o CAIRIM vai passar a ser um Centro de Excelência de nível -2 da
UNESCO?
Este projecto vai de 2022 à 2024, mas eu sinto que o tempo é muito curto para fazer tudo o que nos
propusemos realizar. Temos que fazer um laboratório e a criação de um Museu de Arqueologia
Subaquática, uma tarefa dificil porque requer documentação do material e constituir a linha da história, estudar os conteúdos e ir visitar a literatura. O projecto inclui também a reabilitação de quartos para alojamentos, entre outros aspectos que, em dois anos, não é possível realizar.
Qual é a estrutura do CAIRIM, neste momento?
Temos um arqueólogo permanente, Crimildo Chongo, arqueólogo para questões de reconstituição de
objectos arqueológicos temos um técnico local que é auxiliar da administração e o casal Teixeira Duarte, que continuam com muita vontade de dar a sua contribuição. Além desta equipa temos os parceiros, equipa do Gabinete de Conservação da Ilha de Moçambique (GACIM), da UNESCO e do Ministério da Cultura e Turismo.
Quando se refere ao património subaquático, de que estamos a falar?
Estamos a falar de naufrágios, porque os navios durante as navegações afundaram, nos seculos XIV a XV, mas também temos evidencias de períodos anteriores a estes. Esses navios tinham como carga
porcelanas da dinastia Ming, muito apreciada e que compunham a loiça de cozinha de grande
importância para as elites. Essas porcelanas eram vendidas na Europa. Infelizmente, em Moçambique
essas porcelanas eram objecto de muita pilhagem para fins de comércio, que era ilegal ao abrigo da
legislação da Convenção da UNESCO de 2001.
Outro material subaquático são as missangas usadas para decoração por pessoas da elite. As missangas na Ilha de Moçambique eram usadas como moeda de troca. E também podemos encontrar a cerâmica local. Isso significa que havia uma interação entre os locais e os que vinham de fora, nomeadamente do continente Asiático e do golfo Pérsico.
Já há trabalhos feitos de arqueologia subaquática?
Sim. Mas eu não sou especialista. O principal arqueólogo subaquático é o Dr. Ricardo Texeira Duarte e, ele depois formou outros mais novos aqui em Moçambique, e a sua experiência tem sido utilizada. O CAIRIM tem uma vantagem porque a Ilha de Moçambique é um local de águas calmas onde é possível fazer treinos de mergulho, é possível realizar o turismo cultural, levar os turistas a visitar os museus subaquáticos.
Outra componente muito importante que queremos apostar é a arqueologia de salvaguarda. Isto
implica também um trabalho comunitário muito forte com as pessoas que fazem trabalhos de remoção de terra para salvar todo e qualquer vestígio que possa aparecer de forma desprevenida.
Nem sempre o património arqueológico aparece porque foi procurado, as vezes aparece de forma
desprevenida. Por exemplo, a pessoa cavando uma fundação para fazer um edifício, pode aparecer
material arqueológico.
Eu não sou autora deste projecto de transformação do CAIRIM em Centro de Excelência, apenas sou
directora desta unidade, neste momento prometo dar o meu melhor.